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sábado, 2 de outubro de 2010

Razão da existência

O mundo ao nosso redor resguarda, menos para os olhos de uma criança, os seus mais profundos segredos e revelações.
No livro "A festa de Maria" do maravilhoso escritor Rubem Alves, lê-se em um trecho: "Lá vão pelo caminho a mãe e a criança, quem vai sendo arrastada pelo braço - segurar pelo braço é mais eficiente que segurar pela mão. Vão os dois pelo mesmo caminho, mas não vão pelo mesmo caminho. Blake* dizia que a árvore que o tolo vê não é a mesma árvore que o sábio vê. Pois eu digo que o caminho por onde anda a mãe não é o mesmo caminho por que anda a criança. Os olhos da criança vão como borboletas, pulando de coisa em coisa, para cima, para baixo, para os lados, é uma casca de cigarra num tronco quer parar para pegar, a mãe lhe dá um puxão, a criança continua, logo adiante vê o curiosíssimo espetáculo de dois cachorros num estranho brinquedo, um cavalgando o outro, quer que a mãe também veja, com certeza ela vai achar divertido, mas ela, ao invés de rir, fica brava e dá um puxão mais forte, aí a criança vê uma mosca azul flutuando inexplicavelmente no ar, que coisa mais estranha, que cor mais bonita, tenta pegar a mosca, mas ela foge, seus olhos batem então numa amêndoa no chão e a criança vira jogador de futebol, vai chutando a amêndoa, depois é uma vagem seca de flamboyant pedindo para ser chacoalhada, assim vai a criança à procura dos que mora em todos os caminhos, que é divertido andar, pena que a mãe não saiba andar por não ter os olhos que não sabem brincar, ela tem muita pressa, é preciso chegar, há coisas urgentes a fazer, seu pensamento está nas obrigações de dona de casa, por isso vai dando safanões nervosos na criança, se ela conseguisse ver e brincar com os brinquedos que moram no caminho, ela não precisaria fazer análise..."

Ao fechar nossos olhos para o que a vida quer nos mostrar, criamos uma prisão para nós mesmos, impedindo assim que percebamos a verdadeira beleza das coisas. Lembro-me do dia em que mamãe veio até mim, maravilhada, por ter descoberto que dentro de cada pedra de gelo do congelador se escondiam maravilhosas esculturas misteriosas.
Muitos se contentam em apenas existir e são raros os que escolhem viver.
Vamos, pois, com o nosso cotidiano, desvendar o mito da existência.



Pedro Lança Gomes

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