Opiniões, críticas, reflexões, comentários e saudações serão extremamente, e sempre, bem-vindos

domingo, 11 de dezembro de 2011

Mania de colher

De um sorriso bobo,
alegria leve,
em um dia torto,
um abraço breve.

Do perfume doce,
a lembrança forte
de um dia solto,
um andar sem norte.

Ouve a voz, então,
do ecoar distante
da mesma canção.

E em um breve instante...
desaparece.


É o tempo que não muda sua mesma velha mania irritante de nos fazer esquecer.

O que ele não tira são as sementes plantadas.
Ao invés disso, traz frutos
cujos sabores não há tempo que irá apagar
ou mania que fará esquecer



Pedro Lança Gomes

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A origem do verbo

O coração fala. Também, se não falasse, os olhos seriam suficientes. Eles, em seus longos diálogos mudos, dizem muito mais do que palavras: as luzes se entrelaçam, as cores se cruzam e dois sóis se põem quando não mais se constrangem. Se não houver olhos, ainda haveria os toques, que condizem com réplicas do olhar. Sem os toques, haveria o cheiro, mas esse apenas remete ao que já passou: traz saudades, traz angústia, traz a falta.

Se um dia não houver olhos que mostrem, ou toques que expressem, ou cheiros que lembrem, tornem a ouvir o coração, que, assim como todos que amam, só tem duas palavras por dizer.



Pedro Lança Gomes

sexta-feira, 27 de maio de 2011

O arado, o dom, a rocha!

(Por Pedro Lança Gomes e a noite mais mal dormida de maio)




Era bem assim... vazio, inexistente. Tudo que girava ao redor dançava em tom de dó menor!
Olhava para os lados, e nada via; olhava para cima e o sol me cegava; olhava para baixo e só minha sombra via; olhei, então, para frente, e, mesmo que por um lapso de momento, eu quis continuar, pois a vida mostrou-se mais do que uma mera melodia a ressoar, crua, por entre as paredes, nuas, do meu coração.

A vida as vezes é surda e muda, e apenas os olhos persistem, eles que são os únicos a receberem luz. O tempo mostra que só existe uma janela da alma, e que por entre suas frestas não há brisas falsas, mas vendavais em veras.

Não havia mais luz, só olhares. Vivia então do que ouvia, e não há nada mais deprimente:
Notas e palavras se mordem até se devorarem por completo, só então se tem uma bela composição, por isso os acordes da vida tem um timbre tão amargo! Vivem sozinhos, tocando a mesma tecla quebrada de cravo. As vezes acompanhados por cordas de viola desafinadas ou por sopros inconstantes de uma flauta: antes só que mal acompanhado!

O homem por dentro não passa de terra ermã, erodida e deveastada pelo tempo, na qual nem mesmo o pior silvedo nasce. É preciso preparar o solo para que se torne algo fértil, plantar a melhor das sementes e regá-lo com lágrimas de misericórdia, que caem apenas dos olhos de quem ama. Dos demais, caem como veneno ácido. Matam ao menor contato.

Um dia regaram minhas sementes, e brotaram as primeiras folhas. Delas, flores. Deles, frutos. E deles, sementes, que hoje almejo plantar, para que o mesmo dó menor não acabe em sí diminuto!






Pedro Lança Gomes

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Passos e tramontanas

Tão dura, tão áspera, tão injuriosa palavra é um não!

Acordei um dia e queria voar. Olhava para o céu pelas falhas da cortina: via pássaros, via nuvens, via aviões e discos voadores. Faltava alguma coisa... (sempre falta alguma coisa). Resolvi completar! Tirei a coberta, tirei o lençol, tirei as meias - fazia muito frio, mas todo o meu corpo parecia, cada vez mais, preso dentro de todo aquele pano. Levantei-me e abri, definitivamente, a janela. O vento levantou meus cabelos, e foi ali que, de olhos fechados, ouvi o farfalhar das fenestras com um tom de liberdade. Voei, voei, voei... e nunca mais toquei o chão da mesma forma. Nunca mais toquei o chão. Nunca mas toquei. Não voltei.



Belo Horizonte, 2011






Pedro Lança Gomes

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Fenestras às flâmulas

 Não sei bem ao certo
o que foi que aconteceu.
Pudera algum dia
os céus, os mares e a terra
se juntarem na mais bela poesia?

E declamarem tais versos
os lábios dos anjos.
E derramarem lágrimas
os olhos de um querubim?

Hoje o sol já se pôs
por detrás de um belo monte.
E as nuvens o confortam,
reluzem sua despedida.

E se foi de mansinho
o Senhor da vida
se encontrar com o sol
e lhe apresentar à lua,
que a noite eu via.

E no decorrer do tempo,
mais versos eram escritos
sobre a vida dos santos
que louvavam junto aos anjos.

Na janela vinha a brisa,
balançava a cortina,
deixando um espaço por onde se via
toda a grandeza do criador.

Me levantei e tirei as sandálias.
Despí-me de panos e máscaras,
despí-me de mim mesmo,
para contemplar Tua glória!

Ao longe se via uma árvore em chamas.
À minha esquerda, o fogo,
à minha direita, as nuvens
e, sobre a minha cabeça, Tua mão.

Meus passos se desfaziam pelo ar,
enquanto meus dedos tocavam o chão.
Meus olhos se banhavam nas águas do mar
de um grande oceano infinito,
alimentado por rios de unção.

Tudo era vale sereno,
mas agora só sombra e morte,
mas, junto às nascentes do monte,
ainda crescem videiras fortes.

Ao som da Tua voz elas florecem.
Ao som da Tua voz elas frutificam.
Seus galhos, pesados e exuberantes,
ao som da Tua voz esmorecem.

Após tudo o que se via,
depois do véu que se resgara,
havia apenas um trono
e nele, apenas um Deus.

Ele se levantou, abriu Seus enormes braços
e envolveu o mundo, e chorou.
Via-se amor em cada lágrima.
Voltou-se para o seu trono, e de sua boca
emergiu o segredo dos segredos

Tudo recomeçava diferente do que foi,
mas a chuva não parava de cair.
Formava poças pelo chão.
A água sempre escorria da mesma rocha
e, por onde passava, os troncos velhos se levantavam.
O último arco-íris surgiu, desenhado em Seus cabelos.


Acordei, mas a chuva ainda caía.
Levantei, mas o espelho só mostrava máscaras.
Lá fora, poças pelo chão.
Pessoas passavam e não notavam,
a janela que se abrira,
bem acima das suas cabeças.




Pedro Lança Gomes

Meu livro

        Caiu a primeira gota de chuva e eu ainda estava sentado, esperando uma ideia. Fugi um pouco e fui procurar em outro lugar.
 
       Caminhei por várias ruas e avenidas: vi pessoas apressadas, e resolvi escrever, mas pouco durou a vontade, assim como pouco devia ser o tempo delas. Vi pessoas paradas, e tentei novamente escrever. Em vão, não havia o que dizer dessas.

  Em uma esquina havia um campo, e nele vi um moleque atrevido correndo em poças de lama. Tinha a roupa em trapos, cabelos sujos, um sorriso sincero e olhos do tamanho do mundo. Foi correndo ele até desaparecer de vista, e, quando dei por mim, lá se fora meu livro!

  Continuei, então, minha busca. Percebi que, a medida em que caminhava, as ruas se ramificavam em ruelas e becos. Cada vez mais e mais pessoas haviam, cada um com seu jeito: vi a miséria de uns, vi a hipocrisia de outros. Vi o amor de uns, vi a indiferença de outros. Todos vivendo a simplicidade de uma vida.

  Saindo de um restaurante vi um casal se amando, loucamente apaixonados. Mal conseguia distinguir os dois, mais pareciam um só corpo, torto e desengonçado, como um bebê que aprende a caminhar. Mas não tive vontade de escrever, por um motivo simples: "Paixões são como aquelas ondas do mar, que crescem, quebram e partem, daqui pra nunca mais"

  O mundo é um oceano de paixões.

  A luz começou a falhar, anunciando o fim da tarde. Chovia fininho, mas a noite prometia uma tempestade.

Belo Horizonte, 2008




Pedro Lança Gomes





sexta-feira, 8 de abril de 2011

Contos e pontos

 Na cidade em que eu nasci tinha um céu que é só de lá. As nuvens soltas, adocicadas, raras, riscavam o grande oceano celeste, e o sol dividia o dia com a lua. As águas iam escurecendo e as primeiras velas apareciam na medida em que o sol se cansava (apesar de continuar iluminando). O mar negro, eu nunca cheguei a contemplar, mas já ouvi histórias dos que o fizeram. Bem dizia o bom pegureiro: "Além de todo horizonte há uma barraca, e nela um velho orago. Quem o olhava nos olhos se descobria nu, e nunca mais usava roupas". O sono parecia sempre mais atraente do que a noite. Nesses momentos, minha mente já costumava estar visitando o fantástico Sítio do Pica-pau Amarelo, as casas do menino maluquinho, de bruxos, de monstros, de anjos, e a do meu avô. Por isso continuo usando roupas.

 Tudo era diferente e extremamente heterogêneo, faccionado. Cabelos longos, louros ou escuros (mesmo os intermediários), não eram bem vindos. A vontade era estar em todos os lugares, e ao mesmo tempo ser gigante, formiga, passarinho, viajante, motorista, motoqueiro, herói, artista, e eu. Resumia-se em um sonho polimorfo multidirecional intrínsceco e extrínsceco. Poderia mudar de passado, presente e construir "n" futuros, só não queria o futuro.

 O tempo não define passado, rouba o presente e recolhe o mistério para sí.

 A manga do pé um dia começou a incomodar, assim como a acerola, a carambola, a amora e o limão. As magníficas árvores não tinhas mais um topo, e a terra mudava, cada vez mais, de cheiro.

 10,11,12,13,14,15...quantos? Quando mesmo que foi a última vez que mergulhei naquele velho imenso oceano pueril?

  A última folha caiu do pé bem a tempo da primeira nascer...



Pedro Lança Gomes

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

As crônicas da criação

(Por Gustavo Miranda e Pedro Augusto)






Eis que das negras nuvens da tempestade vindoura uma voz se fez ouvir. E seu timbre tremia as bases da terra, e nada manter-se em pé podia.

Os pássaros voavam formando uma estranha forma no céu, e as águas dos oceanos agitavam-se cada vez mais... Relâmpagos caiam fulminando algumas plantas em seu fim, e tudo o que era negro voltada, por um milionésimo de segundo, a ter cor.

Uma sinfonia suave começou então a ressonar nos longes da escuridão eterna. Era uma sinfonia tão calma, que tudo agora parecia impregnado de eternidade. Uma sensação tão acalentadora, que dava vontade de adormecer e não mais voltar.

Era uma presença plácida que começava a expandir, e ao mesmo tempo convergir em nossa volta.

Sentimos um calor em forma de brisa marítima, com cheiro de liberdade, que passou entre nossos corpos, e nós começamos a entender.

Pouco a pouco, novamente a vida retomava o seu status de vida. Mas não havia cor. Não havia respiração. Não havia mais anda, há não ser aquela presença calma e mansa.

Era uma nobreza tão transcendente, que dar-se-nos-ia tudo ouro de mundo para competirmos com aquilo, mas não passaríamos de vaidade. Era mais do que nobreza! Era uma forma Divina de graça!

Como se, em nossa memória, houvesse algo de uma época antes do tempo, mas que agora despertava. Memória essa que aos poucos tomava forma constante no tempo daquela escuridão, ao passo que a sinfonia aumentava.  Eram versos que nos chamavam de volta, como muitas vozes de um povo que recebe seus irmãos de uma guerra.

As palavras não podiam ser compreendidas nem contidas por linguagens alguma. Eram novas e cada uma era única, ditas apenas uma vez, como o primeiro dia de muitos outros que acreditávamos que viria. As palavras giravam em nossa volta, dançando, tomando formas que eram incomuns no mundo real. Elas se entrelaçavam com a música, formando vários vários códigos genéticos. Cada acorde trazia a tona a verdadeira realidade, e os nossos olhos não suportariam a luz. A luz não era igual. Tinha um tom brando em seus espectros. E pouco a pouco, mesmo de olhos fechados, percebíamos a luz que preenchia todo o vazio. Mas mesmo sentindo essa presença estranha, não se via nada! Tudo era escuro!

Não havia mais sombras, só incertezas de coisas estranhas se formando vagarosamente perto de nós. Mas a música agora podia ser vista, mesmo com os olhos fechados... E por quê? Ela tinha um vestido de muitas cores, era como som de trovões a cada dúvida. Ela dançava, e a cada passo uma nota diferente soava. As notas se encaixavam perfeitamente na nova sinfonia que se formava... Mesmo assim, não podíamos entender seus movimentos.

As cores ofuscavam, e ao mesmo tempo agradavam, aos nossos olhos... E nesse mesmo instante, as palavras ganharam uma forma reificada, e as duas começavam agora a formar uma sinfonia universal de tons e vozes, que há muito não se ouvia. E por quê? Um universo de novas percepções invadia cada parte de nosso ser. Não tínhamos os mesmos nomes, não tínhamos mais nada, éramos parte da música... E era estranho a sensação de estar com olhos fechados sabendo que eles estavam abertos.

A música começou a diminuir sua intensidade, e só se ouvia, bem longe, aquela sensação de uma brandura eterna... Porque agora éramos a música, e corríamos muito além da velocidade da luz - os homens estavam errados, pois o som viaja nos corações.

Passávamos pelas memórias perdidas da humanidade... Queríamos chorar as lágrimas perdidas, mas a Música tomava caminhos próprios. Mesmo os acordes mais melancólicos, transformavam o significado de cada instante em coisas maravilhosas! Cada novo tema nos fazia compreender mais! E agora dançávamos na luz de olhos abertos.

As maravilhas do mundo inteiro, em um só segundo passaram por nós, e mais uma vez caímos na escuridão, e o que achávamos ser a luz, fora o reflexo da música indo embora.

Mais uma vez estávamos sós, e o silêncio mostrou sua face. Era uma bela face, porém recheada de mistério... Por várias eras permanecemos ali, e ele nos ensinou muitas coisas... Nos mostrou a verdade sobre a escuridão, e porque ninguém gostava dela.

Todos pensavam que o silêncio era o fim, porque se enclausuravam em suas tocas no tempo. Não paravam para ouvir cada detalhe da vida, não ouviam o silêncio entre cada verso.

O Silêncio nos mostrou que a escuridão era simplesmente as coisas quietas e intocáveis da vida, coisas das quais ninguém nunca encontraria uma resposta racional, e tampouco irracional. Ele nos disse que transpassava o tempo, e transcendia o espaço. Suas palavras eram profundas como a vastidão de um universo, e pouco a pouco, ele foi sumindo.

De repente, algo se nos fez ver. Ele vestia roupas mais brancas que a nova luz do novo sol, e sua complacência se tornou como uma armadura de ouro. Sua justiça se fez sentir. Seus cabelos eram brancos, e não víamos seu rosto.

Ele começou a falar sobre tudo o que tínhamos visto. E explicou a razão do universo e tudo o mais. Eram coisas lindas! Suas roupas eram sons de todos os tempos.

Repentinamente a escuridão tomou formas, e uma nova vida ia se criando vagarosamente; As plantas pouco a pouco ganhavam cores e vidas; Um rio fluiu no meio do nada e correu até o infinito. Por onde passava, cresciam belas relvas, brotavam muitas cores. Essas cores correram pelo mundo mais uma vez, e mais uma vez uma nova criação nasceu.
O céu era novo, e não tínhamos mais o mesmo nome...
Mais o mesmo nome...
O mesmo nome...
Mesmo...
Nome.









sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Libertas quae sera tamen

Todos temos sede de liberdade, mas muitas vezes nem sabemos o que realmente significa ser livre. Reclamamos muito por viver em um mundo no qual não podemos falar, sentir ou fazer o que queremos, ao mesmo tempo que achamos válidas as regras que regem nossa sociedade.
A maioria das pessoas, quando questionadas sobre a própria liberdade, demonstram uma certa insatisfação, e acabam por atribuir ao dinheiro um caráter condicional, o que, em um âmbito captalista, já era mais do que esperado. O raciocínio é o seguinte: minha liberdade será tanto maior quanto for meu poder aquisitivo. Agindo de acordo com isso, eliminamos a possibilidade de uma introspectiva relfexiva e partimos para uma busca insaciável que tem como alvo o acúmulo de capital.
     

A medida que nos dedicamos à essa busca, vemos o tempo passar, e com ele nossa própria vida. Se soubermos aproveitar as oportunidades certas, realmente podemos alcançar o tão almejado crescimento econômico, nos aproximando do que achamos que nos libertará. No decorrer dos fatos, começamos a perceber mudanças nos nossos relacionamentos mais próximos: sentimos um certo distanciamento. Algo que logo esquecemos ao desfrutarmos do recém-adquirido poder aquisitivo: nos justificamos pelos nossos bens e o efeito que ele causa na nossa vida e na vida alheia. Porém, ao sairmos de casa, no carrão zero km, vemos passar pela rua uma família: pai, mãe e 3 filhos, todos apertados num carrinho velho. Eles se divertiam cantando juntos uma música que tocava no radinho. Rapidamente lembramos da época na qual éramos nós que andávamos em carros velhos, e sentimos vergonha de nós mesmos. Em seguida, viramos a esquina e vemos alguém diferente: tinha um carro mais caro que o nosso, um terno mais caro que o nosso, um relógio mais caro que o nosso. Então, delirantemente, o admiramos e o invejamos. Queremos ser mais "livres" que todos.


A sede de poder nos toma por completo, fazendo-nos achar que nunca temos o suficiente. O sistema nos faz vítimas, presos nesse ciclo vicioso que nos consome e nos tira exatamente o que mais queríamos.Quando percebemos o que se passa, geralmente já é tarde demais.
A liberdade não pode ser comprada, trocada ou roubada! Ela existe na vida gratuitamente, mas devido à singularidade de cada um, se porta diferentemente, sendo situada, e não limitada, pelo nosso cotidiano: podemos fazer o que bem entendermos de acordo com a interação com o que nos cerca.
O homem é um ser de liberdade, e o único que pode escolher não ser livre.



Pedro Lança Gomes